quarta-feira, 23 de outubro de 2013

CONTO POR CONTO #3: "A Agonia da Intimidade" (Jeanette Winterson)

Eu sempre gostei muito de mitologia grega. O que começou com o simples fascínio por Cavaleiros do Zodíaco tornou-se algo maior, uma área de interesse na qual já gastei algum tempo pesquisando e aprendendo.


Depois, claro, tudo evoluiu para o descobrimento de outras mitologias: egípcia, nórdica, celta, etc.


Mas acontece que quem conhece mitologia grega sabe que nem tudo é um mar de rosas, com batalhas épicas, histórias fantásticas e personagens cativantes. Muita coisa lá é de um gosto um tanto quanto perturbador.


A inglesa Jeanette Winterson parece ter se ligado nisso e trouxe à vida uma história um pouco peculiar, misturando erotismo, mitologia grega e críticas à sociedade.


É difícil entender em qual período histórico se passa "A Agonia da Intimidade". A princípio, parece a atualidade, mas então nos deparamos com personagens da mitologia, inclusive a presença de Zeus. Isso, estranhamente, não chegou a tornar a história confusa.


Tudo gira em torno das reflexões e angústias da protagonista e narradora sobre o que aconteceu com sua colega de escola Dafne: ela foi perseguida por Zeus e quase estuprada por ele, mas antes que isso pudesse acontecer, Gaia (deusa da Terra) a transforma em árvore. De acordo com a mitologia grega, isso de fato aconteceu com Dafne (uma ninfa), mas de forma um pouco diferente.


Enfim, então a protagonista se encontra com outras duas personagens: Leda e Helena de Troia. Elas contam suas histórias e se compadecem com nossa protagonista, discutindo sobre esse mundo onde os deuses ainda podem cometer atrocidades com as mulheres mortais. 


Isso até poderia parecer uma viagem se não fosse por um momento na fala de Helena, onde ela compara tal sociedade com uma sociedade de "não responsabilidade e ao mesmo tempo de culpa". 



http://i.telegraph.co.uk/multimedia/archive/02036/jeanette_2036449c.jpg
Jeanette Winterson (1959)


Junto com outros momentos do conto (que tem menos de 10 páginas), podemos perceber um manifesto a favor dos direitos da mulher e sua igualdade perante aos homens. 



  
Os "deuses-estupradores" não são responsabilizados por seus atos, enquanto as mulheres, as vítimas nesse caso, ainda têm que lidar com uma sociedade que alega que elas foram as culpadas, já que deixaram aquilo acontecer. 


Além disso, o próprio título, "A Agonia da Intimidade", revela outro ponto: muitas mulheres ainda tendem a ser criadas numa cultura onde elas, apenas por serem mulheres, não podem desejar e/ou explicitar seu desejo pela intimidade ou pelo sexo, pois "boas meninas não agem assim". 


Na atualidade, com tantas reivindicações feministas por uma sociedade igualitária, o conto constitui-se de uma boa leitura para reflexão, lembrando que o debate é importante e também não devemos nos inclinar a qualquer tipo de extremismo.


Continuo gostando de mitologia grega, até porque praticamente todas mitologias possuem histórias absurdas e grotescas, mas é sempre bom relembrar da parte escura de cada história, do outro lado da moeda.


Portanto, recomendo ;)






NOTA: 7 / 10






[conto em inglês na íntegra no site da autora: The Agony of Intimacy. ]




LIVRO: 
"GRANTA em Português (10): Medidas Extremas". Alfaguara. Traduzido por: Débora Landsberg. 

2 comentários:

  1. Gostei! Não tinha ouvido falar ainda desse conto (nem do livro), acabei de conhecer a sua página através do Blogueiros Literários. Também gosto de Mitologia Grega, já ouviu falar do Livro da Mitologia? Não gostei muito, ainda não li tudo, mas só o começo estranhei demais, ao invés de o autor expôr todos os nomes dos deuses, coloca só os mais usados, o que já não achei certo, mas enfim, gostei desse conto, e do livro!

    Abraços, Lu!
    http://gimmeflowers.blogspot.com.br/

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    1. Primeiro, obrigado pelo comentário :D

      Não li esse livro que você citou, mas acho que sei qual é. Sobre o outro ponto, acho que os autores variam muito em sua forma de contar e interpretar essas histórias milenares e, de fato, isso fica um pouco chato em alguns casos!

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